Web 2.0 começa a ganhar espaço nas companhias

Robert D. Hof *
Business Week, de San Mateo (EUA)


O Vale do Silício adora seus jargões, e nenhum deles provoca mais comentários hoje em dia que o da Web 2.0. Mas, a menos que você seja fanático por tecnologia, terá que ter sorte para descobrir os seus significados. As tecnologias da Web 2.0 carregam nomes estranhos como "wikis" e "mash-ups". E as companhias iniciantes que os empregam - como a Renkoo, Gahbunga, Ning e Squidoo - soam como personagens dos filmes da série "Guerra nas Estrelas".


Não importa. Por trás da aparente bobagem, a Web 2.0 ostenta um mar de mudanças na internet. Os sites Web 2.0 não são tanto páginas on-line para serem visitadas, e sim serviços. Chame isso de Live Web (Internet Viva). Do site de compartilhamento de fotografias Flickr, do Yahoo, à enciclopédia virtual Wikipedia e o ponto de encontro de adolescentes MySpace.com, todos exigem uma participação e interação social ativas.


Mas, embora estejam entre os centros de interesse mais importantes da internet, esses serviços não têm muito o que oferecer ao vasto mundo dos negócios - pelo menos não tinham até agora. Na medida que os trabalhadores percebem que o sistema de rede ao estilo Web 2.0 pode ajudá-los em seus empregos, eles lentamente, mas de maneira contínua, começam a levá-lo para dentro de suas empresas. "Todas essas coisas que se acreditava serem serviços ao consumidor estão sendo transportadas para as empresas", afirma Ray Lane, ex-presidente da Oracle e hoje sócio geral da firma de capital de risco Kleiner Perkins Caufield & Byers.


Os jovens e as pessoas ligadas no mundo virtual sabem o valor que a Web 2.0 tem, mas os executivos precisarão de um curso rápido. Isso porque a natureza desses serviços vai desafiar a mentalidade do "comando-e-controle" das corporações, que já estão sofrendo com as transformações conduzidas pela tecnologia, como a globalização e a terceirização. A Web 2.0 poderá enfraquecer uma série de fronteiras organizacionais - entre gerentes e empregados e entre companhias e seus parceiros e clientes.


Os primeiros sinais disso estão em toda parte. A Walt Disney, o banco de investimento Dresdner Kleinwort Wasserstein e várias outras empresas usam as wikis, ou páginas da internet editadas por grupos de pessoas, para fortalecer a colaboração. Outras companhias estão usando os serviços sociais de rede orientados para as empresas disponibilizados pela LinkedIn e a Visible Path, para contratar funcionários e líderes de vendas a partir de contatos coletivos entre colegas. Os blogs empresariais estão virando quase um clichê.


Assim como o computador pessoal entrou nas empresas pela porta de trás, o mesmo está acontecendo com a Web 2.0. Quando Rod Smith, vice-presidente da área de tecnologias emergentes de internet da IBM, falou sobre as wikis para o diretor de tecnologia da informação do Royal Bank of Scotland (RBS), no ano passado, o executivo disse que seu banco não as usava. Quando Smith voltou-se para os outros participantes de uma reunião, porém, 30 deles balançavam a cabeça em sinal de aprovação: Sim, o banco usava. "As empresas estão ligando muito, querendo saber mais sobre a Web 2.0", diz Smith.


Assim como aconteceu com os PCs, o principal apelo da Web 2.0 é a potência. Computadores mais potentes, conexões de alta velocidade e os serviços fáceis de serem usados da Web 2.0 dão às pessoas uma habilidade quase sem precedentes para a realização de tarefas sofisticadas sem a necessidade de ter de buscar permissão dos sobrecarregados departamentos de tecnologia. Não faz mal que muitos serviços da Web 2.0 sejam grátis, suportados por anúncios, ou que em sua maioria custem menos por mês por pessoa do que uma conta de TV a cabo. "Todas as poderosas tendências tecnológicas são do tipo faça-você-mesmo", observa Joe Kraus, diretor da provedora de wikis JotSpot.


Basicamente, esses serviços estão se combinando em um computador gigante que qualquer pessoa com um PC conectado à internet poderá usar, de qualquer parte do mundo. Quando você faz uma busca no Google, por exemplo, você está na verdade colocando em andamento programas e bancos de dados distribuídos pelo planeta em discos rígidos de computadores.


E mais, as pessoas que usam o MySpace, eBay e o serviço de telefonia pela internet Skype, estão melhorando esses serviços simplesmente por os estarem usando, por estarem compartilhando seu conhecimento. O MySpace se torna mais funcional toda vez que um novo participante acrescenta seus próprios conteúdos e contatos. O resultado: "Os serviços da Web 2.0 estão aproveitando a inteligência coletiva da internet", diz Tim O`Reilly, diretor-presidente da O`Reilly Media, cuja Web 2.0 Conference popularizou a expressão.


Não surpreende que muitos executivos continuem céticos. Afinal, o abismo entre uma agradável página do MySpace e um novo serviço de colaboração empresarial parece bem profundo. "Há uma grande diferença cultural entre as pessoas da Web 2.0 e o departamento de tecnologia", observa o consultor John Hagel, autor de vários livros sobre tecnologia e negócios. E os gerentes de tecnologia naturalmente não querem as pessoas usando esses serviços ao acaso porque eles são sempre vulneráveis a hackers e aos rivais.


Mesmo assim, os serviços da Web 2.0 poderão ajudar a resolver problemas irritantes para as corporações, que os softwares e serviços on-line atuais ainda precisam solucionar. Por exemplo, as empresas estão lutando para superar os problemas com as comunicações on-line, incluindo os spams e o alto custo da manutenção das intranets, que poucos funcionários usam. Portanto, elas estão experimentando uma série de serviços de colaboração. Ross Mayfield, diretor-presidente da empresa de wikis empresariais Socialtext, afirma: "Agora, quase todo mundo com quem eu falo sabe o que é a Wikipedia e não é difícil para essas pessoas imaginar uma Wikipedia empresarial".


Elas fazem mais do que imaginar. O banco de investimento Dresdner Kleinwort Wasserstein usa uma wiki Socialtext para criar agendas de reuniões e encaminhar vídeos de treinamento para novos contratados. Os participantes de um projeto podem evitar trocas infindáveis de e-mails, enviando documentos, agendas e outros materiais a um site wiki, que todas as outras pessoas envolvidas no projeto podem então acrescentar mudanças e fazer comentários. Seis meses depois de lançá-lo, o tráfego no wiki de mais de 2.500 páginas, usado por 25% da força de trabalho do banco, ultrapassou o da intranet. E houve uma queda de 75% no número de e-mails nos projetos que usam as wikis.


As empresas também estão relutando em instalar programas de software de muitos milhões de dólares e inflexíveis, que levam anos para serem lançados. "Eles são pesados e desajeitados e não encorajam a participação", queixa-se Dion Hinchcliffe, diretor de tecnologia da consultoria Sphere of Influence, de Washington.


Uma alternativa são os mash-ups, onde serviços simples e já existentes da Web 2.0 são combinados e encaminhados para um novo uso. No ano passado a IBM ajudou o Centro para a Cidadania Corporativa da Câmara do Comércio dos Estados Unidos a misturar, em poucas semanas, um site de parada única para as pessoas que foram desalojadas de suas casas pelo furacão Katrina e estavam em busca de empregos. As pessoas digitam em um campo o tipo de emprego que procuram e o site então mostra em um mapa do Google, onde elas podem conseguir o emprego almejado. "Os mash-ups são o guarda-chuva sob o qual a Web 2.0 chegará à empresa", diz Peter Rip, da Leapfrog Ventures, que tem investimentos em várias companhias da Web 2.0.


As companhias estão começando a usar páginas do Myspace, Facebook e outros serviços sociais de rede. O motivo: as empresas são, de certa forma, redes sociais formadas para fabricar ou vender algo. A situação pode chegar a um ponto em que a tecnologia engenhosa não será a coisa mais importante a ser dominada.


Os executivos acostumados com linhas de autoridade bem definidas poderão ter de tolerar as tecnologias da Web 2.0 criadas de baixo para cima, para ajudar seus funcionários a colherem os potenciais ganhos de produtividade. Afinal, conforme observa Dave Girouard, vice-presidente da divisão empresarial do Google, que vende tecnologia de busca e outras tecnologias para empresas: "Não se trata de pessoas desperdiçando tempo, e sim de pessoas tentando trabalhar melhor".



Jornal Valor Econômico (versão impressa) - 04/julho/2006
* Robert Hof é chefe de Redação da Business Week no Silicon Valley.
Link relacionado (em inglês): Guia completo sobre a web 2.0 na Business Week