Uma vírgula necessária

"Foi assim que soube que a filha mora com o tio e os três meninos, com famílias da região."

No fragmento, extraído de notícia de uma presidiária que passou dois anos e meio sem ver os filhos, nota-se a falta de uma vírgula importante.

Do modo como foi pontuado, o texto leva a uma primeira compreensão equivocada, que, em seguida, é corrigida pelo próprio leitor. Aparentemente, "a filha mora com o tio e os três meninos" constitui um sintagma, pois a conjunção aditiva "e" poderia estar ligando dois elementos de um adjunto adverbial (numa estrutura do tipo "mora com fulano e beltrano").

Ocorre, porém, que a filha mora com o tio, mas não com os três meninos, que são os outros filhos, todos adotados por famílias da região. A vírgula corretamente posta depois de "meninos" substitui a forma do verbo "morar" que se repetiria, então no plural ("moram"). Ao suprimi-la, emprega-se a vírgula. Até aí, tudo certo.

É fato, entretanto, que, quando ocorre esse tipo de elipse (chamada "zeugma"), há necessariamente a mudança de sujeito, o que nos leva a sugerir, de pronto, o emprego de outra vírgula antes do "e": "a filha mora com o tio, e os três meninos, com famílias da região", o que impediria o leitor de ler como um sintagma aquilo que não o é.

Também seria possível suprimir a conjunção "e", substituindo-a por um ponto e vírgula: "a filha mora com o tio; os três meninos, com famílias da região", mas essa não seria uma boa solução para o caso em questão, já que o trecho está numa oração subordinada (soube que a filha mora com o tio ...), na qual não caberia o ponto e vírgula. É uma opção ótima para períodos compostos por coordenação: "A filha mora com o tio; os meninos, com famílias da região".

Abaixo, o texto corrigido:

Foi assim que soube que a filha mora com o tio, e os três meninos, com famílias da região.

Outra sugestão seria o desenvolvimento do período, sem nenhuma vírgula: Foi assim que soube que a filha mora com o tio e que os três meninos moram com famílias da região.